Êxtase em alto-mar

Quando pisei na Europa pela primeira vez, tudo era mágico. Quem já foi ao Velho Continente conhece a sensação de que a terra lá vale mais que a terra sul-americana. É uma sensação boba, é claro, mas acho que todo mundo a tem na primeira visita ao outro lado do Atlântico. Este episódio é uma forte lembrança daquela época.

Depois de alguns meses descobrindo, como intercambista, inúmeros detalhes das diferenças materiais e culturais entre o Brasil e a Alemanha, entrei em um trem em Frankfurt com destino a Oslo, capital da Noruega.

Dando uma olhada no mapa europeu, você vai ver que, nessa viagem, eu teria que passar pela Dinamarca e Suécia antes de chegar ao destino final. Além do mais, você vai notar que, em alguns trechos, só existe a água do mar. Então como seria possível completar todo esse roteiro dentro de um trem?

Também me perguntei isso. Na época, eu nem sabia o que era internet, então era bem mais difícil conseguir informações sobre viagens, a vida em outros lugares e até sobre a necessidade de vistos e outras burocracias que, nessas horas, são extremamente relevantes.

Fui meio sem saber o que estava por vir. Aos 16 anos, a vida era uma aventura ainda maior do que é hoje. Viajar de trem já era interessante porque sempre acaba-se conhecendo gente de lugares variados e com histórias curiosas pra contar. E, pra um brasileiro, cruzar em poucas horas uma fronteira e dizer “Agora estou em outro país” era um luxo.

Depois de uma curta estadia na Dinamarca, porém, surgiu algo ainda mais interessante. O trem parou e todos os passageiros tivemos que descer. Ao sair pela porta, o susto: não estávamos em uma estação, e sim dentro de um navio.

Era pra levar a bagagem? Teria controle da polícia? Trocaríamos de trem? Perdidaço, simplesmente segui a multidão.

Era um navio turístico normal, muito mais sofisticado que uma das tantas balsas com que estamos acostumados no Brasil. A maioria das pessoas se acomodou nos assentos do bar, restaurante e em outras salas de espera. Descobri então que, nos cerca de 50 minutos que passaríamos ali dentro, estaríamos deixando a Dinamarca e entrando na Suécia.

Me distanciei do grupo e, curioso, fui subindo, subindo, até chegar a um amontoado de máquinas no convés. Com certeza, aquele não era um lugar feito especialmente pra turistas. Além disso, era noite, fazia frio e o frio não era, digamos, dos mais fracos. Mesmo assim, foi ali que passei um dos momentos de maior êxtase da minha vida.

Hoje, pode parecer bobagem, mas, naquela noite, abrindo os braços e sentindo aquele frio desgraçado, eu olhava de um lado a última cidade dinamarquesa desaparecendo e, no outro, contemplava as luzes da primeira cidade de mais um país desconhecido, achando tudo o máximo. Puxa, com 16 anos, cruzar, sozinho, 4 países em cerca de 24 horas é mesmo pra não se esquecer nunca, você não acha?