Um mês dormindo na casa de (quase) estranhos no México


Em 2002, me aventurei por um mês em terras mexicanas. Quando fui, não conhecia ninguém por lá. Entretanto, viajei 30 dias do Pacífico ao Atlântico sem passar uma noite sequer em hotel. Quer saber como?

Quando cheguei no aeroporto internacional da capital, esperei que Mikhail Moura, membro do Hospitality Club com quem eu havia trocado alguns emails nas semanas anteriores, me identificasse. Assim que um rapaz alto se aproximou e perguntou “Elton?”, parecia que éramos velhos conhecidos.

Já no aeroporto, conheci também sua irmã, Varenka, e fomos pra casa da família, onde passei quatro belos dias com um quarto só pra mim, comida à vontade, Internet (luxo na época), telefone e outras regalias.

Uma noite, dançando salsa numa discoteca da cidade, comentei com Mikhail e sua namorada, Fernanda, que queria ir para Acapulco. Eu precisava, porém, de algum lugar pra ficar por lá. Fernanda se lembrou na hora de uma amiga que tinha e, no dia seguinte, recebi a boa notícia: eu poderia ficar, por tempo indeterminado, na casa de Israel, primo de uma amiga da namorada do Mikhail.

No caminho a Acapulco, passei um dia em Taxco e, à noite, cheguei a Cuernavaca, onde dormi na casa da mulher que havia viajado ao meu lado no avião. No dia seguinte, finalmente cheguei à praia mexicana mais conhecida no Pacífico, onde Israel já esperava na rodoviária.

A terra do Chaves

Israel era a simpatia em pessoa. Filho de um engenheiro civil, ele já se destacava, aos 24 anos, no ramo da arquitetura. A própria casa onde sua família morava (de três andares) havia sido caprichosamente construída por ele e seu pai, engenheiro civil.

No meu segundo dia na casa, surgiram duas surpresas tanto mim quanto pra toda a família de Israel. Primeiro, um primo seu (Ricardo) acabava de chegar pra passar cinco dias de férias em Acapulco. Segundo, ele tinha trazido quatro amigos junto e pediu se todos poderiam ficar ali. “Uau, o cara é louco”, eu pensei... Mas acabamos todos sendo bem acomodados na casa. Detalhe: continuei com um quarto só pra mim.

Logo me enturmei com os rapazes mais do que com Israel. Íamos à praia, jogávamos bola e pulávamos à noite do segundo andar da casa na piscina. Passei a chamá-los de “los cinco pendejos”. Passados os cinco dias, chamaram:

Proposta irrecusável

“Elton, vamos con nosotros a nuestra ciudad!” San Luís Potosi, onde eles moravam, era longe pra dedéu - uns 800 km de Acapulco. Além disso , já eram cinco num carro destruído. Em outras palavras: adorei e é claro que fui junto.

Em San Luís, fiquei na casa do Carlos. Doi dias depois, eu tinha que ir para Cancún, onde pegaria o avião de volta ao Brasil. Mais uma vez comentei que precisava encontrar um lugar para ficar e... Adivinhe!

Após um dia inteiro num ônibus, lá estava eu em Playa del Carmen, no Caribe, pertinho de Cancún, na casa de Yovani. Quatro ou cinco dias depois, voei de volta pra casa.

Ah, sim! Quem era Yovani? Primo de Carlos, que era amigo de Ricardo, que era primo de Israel, que era aquele primo de uma amiga da namorada de Mikhail, que eu tinha conhecido na Internet.


Sem ter onde dormir em Viena


Depois do sufoco que passamos sendo barrados na viagem à Hungria, Anne e eu voltamos de trem à capital austríaca e pegamos o ônibus para o camping onde havíamos passado as três noites anteriores.

Quando chegamos, ele já estava fechado. Os check-ins encerravam às 22h. Sem ideia de aonde ir e muito menos com dinheiro para pagarmos um hotel no centro da cidade, saímos caminhando pelas ruas da vizinhança.

Minha sugestão era bater nas portas das residências e pedir para que, caridosamente, nos deixassem passar a noite lá. Tudo bem que isso já tinha funcionado em Portugal, mas, cá entre nós, há um abismo entre a hospitalidade lusitana e a austríaca.

Portanto, logo percebemos que isso não daria certo em Viena. Foi então que encontramos um sobrado com uma placa informando que havia quartos para hóspedes. Ou seja, era uma pousada.

Check-in?

Tocamos a campainha várias vezes em vão. Passamos pelo portão aberto, abrimos a porta destrancada e procuramos por alguém na recepção. Ninguém.

Continuamos ousados. Subimos até o primeiro andar, até o segundo e giramos a maçaneta de um quarto no terceiro piso. A porta se abriu e vimos que o quarto, com cama de casal, estava arrumadinho. “É aqui mesmo”, concordamos.

Dormimos muito bem e acordamos cedíssimo para tomarmos um longo banho antes de partirmos – de preferência sem encontrarmos os donos da casa.

Check-out?

Depois do banho, arrumamos a cama e tentamos apagar todos os vestígios da nossa estadia. Nos vestimos, colocamos as mochilas nas costas e, quando íamos descendo sorrateiramente as escadas, a anfitriã nos surpreendeu. Como dois anjinhos, dissemos algo como: “Puxa, íamos procurá-la agora porque chegamos tarde e já temos que ir agora cedo.”

Duvido que ela tenha acreditado, mas não houve estresse, pagamos pelo quarto e fomos embora. O preço era até razoável, mas se soubéssemos que pagaríamos pela cama, teríamos continuado dormindo nela pelo menos a manhã inteira.

Tentando entrar na Hungria sem visto

Alguns anos atrás, fui passear em Viena com Anne, uma namorada alemã. Depois de três ou quatro dias de turismo na capital austríaca, “deu a louca” e decidimos pegar o trem para Budapeste.

Eu sabia que cidadãos brasileiros precisavam de visto para atravessar a fronteira, mas decidimos arriscar sem ele, mesmo. Assim, compramos uma passagem e, com mochilas nas costas, entramos em uma cabine com seis lugares e ali ficamos quietinhos.

Em pouco tempo, o trem parou e alguns policiais entraram. Pelo menos é o que deduzimos, pois não tínhamos coragem de ir até a porta e colocar a cabeça para fora.
A parada foi curta e, assim que a locomotiva voltou a funcionar, entramos um estado misto de alívio e euforia. Pena que durou pouco.

Controle

Os oficiais da imigração húngaros entraram na nossa cabine e, gentilmente, pediram para ver nossos passaportes. À Anne, bastou mostrar a carteira de identidade alemã e podia prosseguir a viagem tranquila.

Eu, no entanto, queria mostrar qualquer coisa – menos o passaporte brasileiro, o qual, na época, era verde. Comecei entregando uma carteira internacional de estudante feita meses antes em Portugal.

Não funcionou. A cara de bobo, o espírito eventureiro de 18 anos e a explicação de que seriam “só duas noites em Budapeste” também foram em vão.

Acabamos descendo na parada seguinte, onde ficamos esperando sentados no chão, escoltados por um soldado que não falava nada além de húngaro, até o próximo trem em direção a Viena passar.

Quando voltamos à capital da Áustria, o camping em que havíamos ficado nas noites anteriores já estava fechado. É assim que começa a próxima história...

Ganhando dinheiro desenhando



Foi mais ou menos com quatro anos que comecei a desenhar. Pouco mais tarde, enquanto as outras crianças (e as professoras) faziam os admiráveis homens e mulheres-palitos, meus seres humanos já tinham peito, pescoço, braços e até pés.

As primeiras noções de sombra vieram aos 12 ou 13 anos. Depois, as técnicas de perspectiva e profundidade. Com 16 anos, eu já copiava qualquer ilustração, adorava desenhar o Wolverine e arriscava fazer retratos de pessoas famosas e bem chegadas – ótimas cobaias.

Desenhar era um vício que eu alimentava em casa, na escola e, eventualmente, também nas viagens mundo afora.

Numa dessas viagens, algo mudou. Foi em Paris, quando babei vendo alguns artistas fazerem caricaturas dos turistas em poucos minutos. Como eu ainda recebia mesada na época, imaginei que aqueles desenhistas ganhavam uma boa grana com aquilo e acabei sonhando: “Puxa, imagine se um dia eu puder desenhar tão bem e tão rápido assim! Será que seria capaz de ganhar dinheiro em qualquer lugar?”

Primeiras moedas

Um ano e meio depois, parei numa rodoviária em Corrientes, na Argentina, enquanto ia de Assunção a Córdoba. O próximo ônibus só sairia sete horas depois. Sem mais o que fazer, tirei uns lápis da bolsa e comecei a fazer esboços dos rostos de alguns passageiros que também estavam sentados por perto.

Uma criança curiosa se aproximou e atraiu a atenção de um zelador, o qual parou, riu e chamou um colega. Quando me dei conta, eu estava rodeado de gente e alguém perguntou: “Cuánto cobrás para dibujarme a mí?” Surpreso, respondi: “Un peso!”

Não era muito, mas foi a primeira vez que eu recebi algo por desenhar. Quando embarquei no ônibus, tinha ganhado sete pesos, que equivaliam a 14 reais.

Não parei mais e o valor foi aumentando. Tanto que, menos de dois anos mais tarde, com cada caricatura que eu fazia, conseguia pagar duas noites do hotel em Pushkar, uma pequena cidade na Índia.

Desesperado

Uma vez, em Cancún, faltando ainda quatro dias para voltar ao Brasil, perdi minha carteira com o cartão de crédito e uns dólares que eu havia acabado de sacar no banco. Sem cartão de crédito e sem dinheiro – o que podia fazer?

O jeito foi pegar minha prancheta, folhas e lápis de cor, colocar a mochila nas costas e sair pela praia perguntando quem queria uma caricatura. Depois de hesitarem, quatro italianos toparam entrar na brincadeira, apesar da indisposição para pagar muita coisa pelo trabalho.

No final, felizmente se divertiram com os cabelos, orelhas, bocas e narizes exagerados e me ajudaram a conseguir outras vítimas outros clientes. No fim das contas, aquele dia de trabalho foram suficientes para eu passar os três dias seguintes aproveitando a beleza do Caribe.

Muda o país, muda a comida


Se você for passar uma temporada na Europa ou na América do Norte, é bom começar a se preparar psicologicamente. Assim como quando teve de abandonar seu ursinho ou travesseiro quando era criança, agora vai chegar a hora de dizer adeus ao diário arroz e feijão.

Em alguns lugares, a maioria das pessoas nunca viu uma panela de pressão. Se viu, não tem a mínima ideia pra quê serve. Provavelmente, você encontrará feijão em pequenas latas, mas com aquele tom marronzinho e o sabor do que você come na sua casa no Brasil… esqueça!

A abdicação não vai parar por aí. Pastel, farofa, pão de queijo, cachorrão com batata palha, paçoca, pé de moleque, bolo de cenoura e nega maluca – também já eram!

Nem tudo está perdido 

Pra quem sentir falta dos doces da terra-natal, eis um alívio: a cada ano que passa, leites condensados ocupam as prateleiras de mais supermercados. Pelo menos o brigadeiro está garantido! Agora cuidado: não comece a fazer um pavê sem ter certeza de que irá encontrar Guaraná no lugar em que você estiver.

“E a cachaça?”, você deve estar perguntando. Jamais a encontrei em supermercados do Hemisfério Norte, mas confesso que também nunca procurei (rs). Apesar de ser leigo no assunto de bebidas alcólicas, acho que tal da caipirosca com vodca não fica tão diferente da caipirinha com pinga. Se ficar ruim, você toma tudo sozinho e pronto.

Outro gosto 

Algumas coisas ainda estarão disponíveis em qualquer lugar, mas não necessariamente com o gostinho com que você está acostumado. Quando experimentar o chocolate, a pizza e a carne de outros países, você vai saber do que estou falando.

E por falar em carne, provavelmente você tenha se acostumar com três coisas. Uma: comer menos. Duas: incluir carne de veado, carneiro e pato ou ganso no seu cardápio. Três: tolerar carne mal passada. Mesmo de frango. Credo!

Não se assuste com a falta de noção dos europeus, por exemplo, ao comerem frutas. Em pouco tempo, você vai rever seu conceito de “suco de laranja”, se acostumar com pessoas descascando laranja com as mãos ou comendo a maça inteira - com semente e tudo. E sabe quando a banana está no ponto, cheia de pintinhas marrons? Já passou do ponto pras pessoas que jamais viram uma bananeira crescer nos seus países.

A parte boa 

Mas calma porque também há coisas boas. O leite na Europa é uma delas. Barato e espesso, acaba sendo também responsável por uma enorme variedade de iogurtes e queijos pra todos os gostos. Todos mesmo.

E já ouviu falar do pão alemão? Do queijo marrom norueguês? Da paella espanhola? Do vinho italiano? E dos doces canadenses do Tim Hortons, do cheese cake estadunidense, do fondu suíço, do goulash húngaro..? A lista é enorme. E tinha que ser, mesmo. Afinal de contas, você vai ver que aguentar a falta de um bom bife com arroz e feijão não é fácil.

Ciganos batedores de carteira na Itália

Com o que você associa a palavra “ciganos”? Se pensou em música, dança e roupas coloridas, não há nada de errado. Entretanto, a realidade desses povos espalhados ao redor do mundo não é… digamos tão colorida assim.

Ao que tudo indica, os ciganos provêm da Índia. No final do século 14, os primeiros grupos chegaram à Europa e continuaram andando para lá e para cá em todo o continente. Seu nomadismo e diversos costumes sempre causaram incômodo às comunidades locais, levando os nazistas a incluí-los na lista negra. Provavelmente, meio milhão deles foram mortos nos campos de concentração durante a Segunda Guerra Mundial.

A perseguição não parou por aí, como demonstram recentes ataques a assentamentos de ciganos em determinadas regiões da Itália, França e Irlanda do Norte. Mas será que isso tem ocorrido só por causa dos costumes dessas famílias?

Itália

Proavelmente, entre 60 mil e 90 mil deles vivem atualmente na Itália - pelo menos 3 mil nômades na capital Roma.

Em 2005, assim que cheguei para viver na cidade, fui logo avisado: “Muito cuidado com os ciganos!” Segundo os locais, seria fácil reconhecê-los, principalmente as mulheres com saias longas, chinelos ou sandálias e cabelos compridos.

Uma das suas características culturais é andar em bandos. Muitas vezes, identificá-los é uma questão de auto-segurança, pois estar próximo desses grupos pode significar ficar sem sua carteira ou bolsa – principalmente dentro e ao redor dos ônibus e metrôs.

Tudo bem que 97% das crianças ciganas não frequentam a escola, que a maioria dos adultos é analfabeta, que a expectativa de vida deles é por volta dos 50 anos e que as condições precárias dos assentamentos e barracas se somem a outros inúmeros fatores que os empurram para as margens da sociedade. Mas o que você vai pensar quando for a Roma e for roubado por um deles?

Indignação

Ao longo dos meses em que vivi na capital italiana, me acostumei a escutar relatos de turistas inconformados por terem perdido dinheiro, passaporte e outras coisas durante os passeios na cidade. A indignação só aumentava porque tanto cidadãos quanto Estado estão cansados de saber do problema, mas até hoje não encontraram nenhuma solução. Houve, porém, uma tarde em que minha revolta chegou ao ápice.

Assim que subi no ônibus em direção ao trabalho, vi que duas mulheres e uma moça, todas ciganas, estavam em pé, com aquele olhar de caçadoras de níqueis. Fiquei também em pé, próximo da porta dos fundos, no meio do trio e de olho nas três.

Eu achava que, a qualquer momento, pegaria uma delas no flagra tentando abrir a bolsa ou mochila de alguém distraído, mas o que aconteceu foi ainda pior.

A mais velha do grupo tinha um bebê no colo. Apoiada no braço esquerdo da mulher e coberta com um pano, a criança foi ficando cada vez mais próxima de mim conforme a mulher dava pequenos passos na minha direção.

De repente, senti minha carteira se mexer, roçando minha coxa. Instintivamente, coloquei a mão no bolso e me surpreendi com outra mão tentando entrar ali. Na verdade, a cigana estava com o bebê amarrado! O braço dela, coberto pelo pano, estava livre, leve e solto para ela meter a mão na carteira ou dentro da bolsa de quem ela quisesse.

Indignado, fiz um escândalo como um típico italiano, fazendo com que o motorista parasse o ônibus e as três descessem. Depois de chegar à rua, a figuraça ainda cuspiu em minha direção. Não acertou! :-P

Algumas semanas depois, vivi uma situação semelhante em um ônibus lotado, esprimido entre desconhecidos e flagrando um homem também tentando enfiar a mão no bolso dianteiro da minha calça jeans. Novo escândalo, nova parada de ônibus, novo ladrão descendo inconformado.

Portanto, quando for a Roma, Barcelona, Paris e outras cidades europeias onde ouvir “Cuidado com os ciganos!”, fique realmente muito atento.

Escravidão na Itália

Foi no início do verão de 2000 que tudo aconteceu. Morando na Alemanha e ansiosos para finalmente conhecermos a Itália, minha irmã e eu procuramos pela internet alguma oportunidade de viver e trabalhar em meio à “buona gente”.

Com muita sorte, encontramos um anúncio de Fabio, um cara de uns 30 anos que estava recrutando pessoas para trabalharem quatro horas diárias em seu sítio em troca de cama e comida.

Segundo o anúncio e os e-mails que trocamos com o simpático italiano, tudo seria perfeito. A propriedade ficava numa região montanhosa próxima de Urbino, uma bela cidade universitária no leste do país. De acordo com o Fabio, ele e os pais produziam uma série de alimentos “biológicos” e viviam em harmonia com a bela natureza na sua propriedade.

Além do mais, combinamos que, por cada hora de trabalho extra, receberíamos 8 dólares. Assim, decidimos passar três agradáveis meses ali e ainda juntar uma grana para a próxima etapa do nosso ano de mochilão.

Bem-vindos?

Quando chegamos em Urbino, telefonei conforme tínhamos combinado e ficamos esperando Fabio ir nos buscar. Quarenta minutos depois, um carro foi estacionado na nossa frente. “Será que é ele?”, nos perguntamos. A porta do motorista se abriu e um sujeito saiu. Sem nos cumprimentar, abriu o porta-malas, olhou para nós e disse: “Andiamo!” Parecia que estávamos no início de um filme de terror como O Albergue ou O Motel.

Aquele sujeito vesgo e de poucas palavras era mesmo Fabio. Depois de percorrermos 20 km em silêncio, chegamos ao sobrado em cujo segundo andar ele vivia com os pais. Pareciam o gigante a bruxa da floresta: um senhor troncudo de mãos grossas e com um dedo a menos, e uma senhora com olhar maligno que tentava dissimular se fazendo de boazinha. Mas não éramos bobos.

O lar

Nosso quarto tinha uma cama de casal que afundava no meio. Toda a comida era regulada. Era tão grave que minha irmã decidiu fazer dieta para ceder um pouco de suas porções para eu não passar (tanta) fome. E tinha algo ainda mais grave: os três fumavam. Faziam isso inclusive na cozinha, enquanto preparavam as refeições e logo depois de comerem, enquanto assistiam a futebol na pequena televisão ao lado da mesa. Me lembro como se fosse ontem da cena da bruxa com o cigarro na boca enquanto preparava a salada de alface.

A paisagem natural da região era, de fato, muito bonita. O sítio, entretanto, não. Da casa às plantações, tudo era muito mal cuidado, dando a sensação de ter várias partes abandonadas. Pra você ter uma ideia, havia quatro ou cinco carros apodrecendo ao ar livre - provavelmente porque eles não estavam dispostos a pagar algum imposto ou a levá-los até um ferro-velho na cidade.

Quanto ao trabalho, não nos contavam o que faríamos no dia seguinte. Na primeira noite, perguntei durante o jantar. “Agora, comemos; depois falamos de trabalho”, foi a resposta ríspida do pai. Mas tudo que ele disse "depois" foi a hora em que deveríamos estar em pé de manhã. Após isso, seguiram os três com a atenção voltada ao jogo de futebol na TV.

Praticamente, ninguém conversava conosco. Até quando estávamos nas plantações de tomates ou de uvas, por exemplo, o gigante da floresta se limitava a movimentar as mãos ou ferramentas e murmurar coisas como “like this” ou “after”, como se fôssemos de planetas diferentes. Detalhe: eu já falava italiano. Apesar disso, naquele contexto, não seria difícil para um brasileiro entender o que “così” e “dopo” ou “poi” significam.

Não nos informavam sobre nossas horas de trabalho nem nos davam oportunidade de planejar nossos dias. Nos usavam duas ou três horas de manhã; depois o mesmo tanto à tarde. Nos intervalos, não podíamos usar internet nem telefone. A cidade era longe demais para irmos até lá a pé. E, claro, só tínhamos três refeições diárias – sempre com eles, a TV ligada e os cigarros acesos.

Fuga

Encurtando a história, no final do segundo dia, um casal estadunidense que vivia no primeiro andar do sobrado se aproximou de nós. Eles já estavam acostumados com jovens estrangeiros decepcionados como nós e se prontificaram a nos ajudar a, literalmente, fugir dali.

Ligaram para um amigo em outra fazenda e pediram que ele nos acolhesse. Quando? O mais rápido possível. De repente, bateram à porta. Fabio e o pai tinham escutado nossas conversas e desceram indignados para evitar que fôssemos embora dali.

A discussão foi feia, mas, na manhã seguinte, saímos sem falar com nenhum deles e Bruce, o estadunidense solícito, nos levou até a cidade, de onde seguimos em caronas até Pescara, onde vivemos “felizes para sempre” por duas semanas na casa do Rafaelle – este, sim, um “cara 10” com esposa, filho, casa, hábitos e amigos adoráveis!

Dicas para suportar o frio do Hemisfério Norte

Para quem está acostumado à temperatura média anual de 19°C em cidades como São Paulo, Brasília e Belo Horizonte, encarar o frio do Hemisfério Norte pela primeira vez é barra pesada. Ainda mais sabendo que, em muitos países, o frio não é apenas intenso, como também dura muitos meses.

Provavelmente, depois de sobreviver a um inverno inteiro em lugares como Escandinávia, Europa Central, Rússia ou Canadá, você irá entender por que as pessoas desses lugares idolatram o sol e estão sempre falando sobre o tempo.

Se você planeja encarar o inverno de alguma dessas regiões, tenha sempre três coisas em mente:

1) Mantenha-se agasalhado

Nós humanos somos seres homeotérmicos e funcionamos à temperatura de 37°C. Quando a temperatura externa é muito mais baixa que isso, uma região do nosso cérebro chamada hipotálamo ordena a constrição dos vasos sanguíneos e outros mecanismos para nos manter aquecidos. Com isso, a pele fica pálida, fria e ressecada.

O hipotálamo encara a proteção do coração e outros órgãos vitais como prioridade, “desprezando” extremidades como dedos, orelhas e nariz. Dependendo do tempo de exposição ao frio, os vasos sanguíneos dessas “batem em retirada”, deixando-as sem combustível e sem calor. É por isso que pequenos movimentos como segurar uma caneta ou amarrar o cadarço podem se tornar missões impossíveis num dia de muito frio.

Apesar de o princípio ser o mesmo entre os humanos, algumas pessoas suportam temperaturas baixas fazendo menos esforço. Principalmente se elas tiverem sido expostas ao frio repetidamente.

Se você vem de um país tropical como o Brasil, esse não deve ser o seu caso. Portanto, não adianta querer dar uma de bonzão e mostrar que “não está sentindo frio”. Fazendo isso, você ficará mais vulnerável e provavelmente acabará sendo vítima fácil de resfriados e gripes.

2) Alimente-se bem

Durante a digestão, nosso corpo produz calor e libera substâncias que serão distribuídas entre as células, aumentando a capacidade dessas de produzirem novamente calor. Pense nos músculos e de onde vem todo o material que os forma.

Além disso, grande parte do que o organismo não precisar de imediato ficará acumulada entre os músculos e a pele, formando um isolante térmico. Pensando assim, ganhar uns quilinhos durante um inverno rigoroso não é tão mau assim, não é mesmo?

3) Exercite-se

O urso e outros animais fazem o quê no período mais frio do ano? Nós, ao contrário, devemos nos exercitar.

Duvida? Então me diga o que acontece no seu corpo quando fica com frio? Ele treme. Justamente! Deixando bem claro: o exercício físico é tão importante no frio que, se você não o faz por vontade própria, seu próprio corpo se encarrega de fazê-lo. Há quem diga que a tremedeira pode até quintuplicar a produção de calor no corpo.

Mas lembre-se de sair agasalhado se for fazer exercícios em lugares frios e de manter-se novamente aquecido após a prática de esportes.

Êxtase em alto-mar

Quando pisei na Europa pela primeira vez, tudo era mágico. Quem já foi ao Velho Continente conhece a sensação de que a terra lá vale mais que a terra sul-americana. É uma sensação boba, é claro, mas acho que todo mundo a tem na primeira visita ao outro lado do Atlântico. Este episódio é uma forte lembrança daquela época.

Depois de alguns meses descobrindo, como intercambista, inúmeros detalhes das diferenças materiais e culturais entre o Brasil e a Alemanha, entrei em um trem em Frankfurt com destino a Oslo, capital da Noruega.

Dando uma olhada no mapa europeu, você vai ver que, nessa viagem, eu teria que passar pela Dinamarca e Suécia antes de chegar ao destino final. Além do mais, você vai notar que, em alguns trechos, só existe a água do mar. Então como seria possível completar todo esse roteiro dentro de um trem?

Também me perguntei isso. Na época, eu nem sabia o que era internet, então era bem mais difícil conseguir informações sobre viagens, a vida em outros lugares e até sobre a necessidade de vistos e outras burocracias que, nessas horas, são extremamente relevantes.

Fui meio sem saber o que estava por vir. Aos 16 anos, a vida era uma aventura ainda maior do que é hoje. Viajar de trem já era interessante porque sempre acaba-se conhecendo gente de lugares variados e com histórias curiosas pra contar. E, pra um brasileiro, cruzar em poucas horas uma fronteira e dizer “Agora estou em outro país” era um luxo.

Depois de uma curta estadia na Dinamarca, porém, surgiu algo ainda mais interessante. O trem parou e todos os passageiros tivemos que descer. Ao sair pela porta, o susto: não estávamos em uma estação, e sim dentro de um navio.

Era pra levar a bagagem? Teria controle da polícia? Trocaríamos de trem? Perdidaço, simplesmente segui a multidão.

Era um navio turístico normal, muito mais sofisticado que uma das tantas balsas com que estamos acostumados no Brasil. A maioria das pessoas se acomodou nos assentos do bar, restaurante e em outras salas de espera. Descobri então que, nos cerca de 50 minutos que passaríamos ali dentro, estaríamos deixando a Dinamarca e entrando na Suécia.

Me distanciei do grupo e, curioso, fui subindo, subindo, até chegar a um amontoado de máquinas no convés. Com certeza, aquele não era um lugar feito especialmente pra turistas. Além disso, era noite, fazia frio e o frio não era, digamos, dos mais fracos. Mesmo assim, foi ali que passei um dos momentos de maior êxtase da minha vida.

Hoje, pode parecer bobagem, mas, naquela noite, abrindo os braços e sentindo aquele frio desgraçado, eu olhava de um lado a última cidade dinamarquesa desaparecendo e, no outro, contemplava as luzes da primeira cidade de mais um país desconhecido, achando tudo o máximo. Puxa, com 16 anos, cruzar, sozinho, 4 países em cerca de 24 horas é mesmo pra não se esquecer nunca, você não acha?

Respeitando as diferenças

Circula pela net:
Um sujeito estava colocando flores no túmulo de um parente, quando vê um chinês colocando um prato de arroz na lápide ao lado.

Ele se vira para o chinês e pergunta:
- Desculpe, mas o senhor acha mesmo que o defunto virá comer o arroz?

E o chinês responde:
- Sim, quando o seu vier cheirar as flores.

Moral da história:

Respeitar as opções do outro, em qualquer aspecto, é uma das maiores virtudes que um ser humano pode ter! As pessoas são diferentes, agem diferente e pensam diferente. Portanto, nunca julgue. Apenas tente compreender.

Sete hits da balada alemã

Como acontece em vários países, a Alemanha tem algumas músicas de pop e hip hop que não saem das baladas. Os links a seguir são de alguns desses maiores sucessos:

1 - Ding, de Seeed: Conta a história de um homem casado que conhece uma “coisa linda” na balada, esconde a aliança, dá uns bons pegas e depois tem problemas porque ela não larga do pé e ameaça o casamento dele.

2 - Hammer, de Culcha Candela: É sobre como um rapaz baba por uma mulher em uma discoteca.

3 - Alles Neu, de Peter Fox: Este é um cantor de boa reputação, com vários sucessos parecidos com este. Este hit é sobre ele, ele, ele... “Se você não gostar, faça algo novo”, ele diz no refrão.

4 - Schwarz zu blau, de Peter Fox: Relata Berlim de madrugada, depois de uma balada. “Bom dia, Berlim, você consegue ser tão feia, tão imunda e cinzenta” é um trecho do refrão.

5 - Bettina, pack deine Brüste ein!, de Fettes Brot: Este grupo faz sucesso há mais de uma década. O refrão é formado pelo nome da música seguido de mais uma frase. Traduzido, fica assim: “Bettina, empacote seus peitos! Bettina, por favor vista alguma coisa!”.

6 - Drei Tage Wach, de Luetzenkirchen. Esta música é um exemplar da música eletrônica e seu nome significa “Três dias acordado”. Clicando aqui, você vai ouvir uma mixagem com ela e a anterior.

7 - Krawall und Remmidemmi, de Deichking: É incrível como tanta gente conhece a letra desta música, a qual fala de uma festa feita na casa de alguém cujos pais viajaram.

O que você precisa saber antes do seu primeiro voo

Para tudo existe a primeira vez, inclusive pegar o avião numa viagem ao exterior. Se tivesse lido um manual antes de ir ao aeroporto pela primeira vez, eu teria feito algumas coisas de modo diferente. Talvez estas 8 dicas ajudem você a se preparar para a sua primeira (ou próxima) viagem:

1 – Faça o check-in online

Várias companhias aéreas oferecem este serviço cerca de 24 horas antes da viagem. Fornecendo seus dados à empresa, você tem seu voo confirmado, escolhe sua poltrona e pode imprimir seu cartão de embarque em casa.

2 – Conheça os trajetos até os aeroportos

Gastar alguns minutinhos na internet pesquisando como ir do aeroporto ao centro ou ao hotel e vice-versa pode significar a economia de um bom dinheiro e tempo durante esses trajetos.

3 - Tenha os papéis em mãos

Faça uma lista antes de sair de casa: Passaporte, carteira de estudante, cartões de crédito, passagens, confirmação de voos, reservas de hoteis e contatos no país de destino impressos são imprescindíveis.

4 - Diminua a bagagem

Sempre dá para tirar um pouco mais de dentro da mala. Nada de comprar coisas novas para levar para a viagem! Deixe para fazer isso quando chegar no seu destino. O ideal é você não levar mais do que pode carregar sozinho. E cuidado com

5 – Seja prático com a bagagem de mão

Procure levar apenas o absolutamente necessário e o que possa quebrar dentro de uma única bagagem de mão. Quanto mais sacolas ou bolsas você levar, maior é a chance de chamar a atenção dos controladores de bagagem do aeroporto.

6 - Remédios e líquidos

Evite levar remédios na bagagem de mão. Líquidos com mais de 100ml, nem pensar! Água não irá faltar nos aeroportos ou aviões.

7 – Tenha calma ao entrar e sair do avião

Na hora de embarcar, sua poltrona já estará esperando só por você. Quando o avião pousar, ainda levam alguns minutos até que as portas se abram e todos consigam sair. Portanto, não se apavore soltando o cinto e tentando pegar a bagagem de mão desesperadamente para congestionar o corredor esperando em pé. Também não adianta querer chegar fora do aeroporto sem suas malas.

8 – Respeite os comissários de bordo

Eles trabalham para a companhia aérea; não para você. Com gentileza e um sorriso sincero, é bem provável que você consiga ser bem tratado e até agraciado com regalias como um salgadinho ou um almoço extra. Peça com jeitinho e agradeça...

9 – Seja discreto e seguro no controle no aeroporto

Tanto na partida quanto na chegada, aja com naturalidade durante o controle de bagagens e passaportes. “Quem não deve, não teme.” Portanto, tenha todos os itens do número 2 em mãos, olhe nos olhos dos controladores e responda apenas às perguntas que lhe fizerem – por mais irritantes que sejam. Antes de querer dar uma de malandro, lembre-se de que dezenas ou centenas de espertalhões passam por ali todos os dias.

Roubado em Cochabamba

Eram menos de 7h da manhã quando eu e meu amigo Guilherme chegamos na estação rodoviária central de Cochabamba, na Bolívia.

Cada um com uma mochila nas costas e ambos perdidaços, saímos procurando, de porta em porta, um hotelzinho barato pra passarmos as próximas 3 noites na cidade.

Muito caro, lotado, feio demais... cada vez que entrávamos em um hotel, encontrávamos uma nova razão pra voltarmos à rua em busca de algo melhor.

Como as ruas estavam praticamente desertas, notamos claramente que alguém nos seguia pela calçada. Olhamos desconfiados quando o senhor nos alcançou e questionou sobre nossa nacionalidade e o que fazíamos ali àquela hora do dia, mas me acalmei assim que ele mostrou um crachá se apresentando como oficial da polícia.

“Vocês ainda não se registraram no escritório de imigração da cidade?”, nos perguntou o tal policial. Respondemos, surpresos, que não. Cochabamba andava tendo sérios problemas com o tráfico de drogas, especialmente por causa de jovens brasileiros disfarçados de turistas. Pelo menos foi essa a história que o cara nos contou. Nós, apesar de confusos, a engolimos.

Em seguida, o sujeito pegou o celular e ligou pra alguém. Ao desligar, nos disse: “Uma viatura está vindo nos levar até o escritório pra vocês se registrarem agora”. Poucos segundos depois, ele sinalizou pra um taxista. O motorista parou, conversou com o tal policial e este então nos falou: “Vamos, entrem porque a viatura deve demorar.” Entramos.

Claro que sentíamos que alguma coisa não estava em ordem, mas o que podíamos fazer? Depois do Guilherme e do oficial, me sentei no banco de trás do taxi, fechei a porta e o motorista arrancou.

Revista

O oficial era bem simpático e, aos poucos, fui me tranquilizando. Amigavelmente, ele fez uma série de perguntas, como quanto tempo queríamos ficar na cidade, aonde iríamos depois, quanto dinheiro trazíamos e onde o guardávamos.

Como quem não quer nada, passou a revistar a bolsa do meu amigo, supostamente só pra verificar se não trazíamos mesmo entorpecentes. Por fim, pediu pra ver nossos documentos e, quando abri minha bolsinha com o passaporte e 6 notas de U$50, ele contou o dinheiro na minha frente e devolveu tudo direitinho.

Convencido da nossa boa índole, o senhor nos disse que nos pouparia do transtorno de ir até o escritório fazer o tal registro e pediu ao taxista que nos levasse de volta à região onde tinha nos pegado.

Alívio?

Paramos em frente a um hotel que o policial recomendou e, alegres, saímos do carro. Antes de partir, ele ainda nos desejou uma boa estadia e alertou que tomássemos cuidado com nossas coisas porque a cidade estava infestada de ladrões.

Entramos no hotel, fizemos o check-in e nos sentamos pra aguardar até que nosso quarto estivesse limpo. Foi nesse ínterim que o Guilherme, revirando sua mochila, começou a resmungar: “Cadê minha câmera? Minha câmera sumiu!” Cada vez mais impaciente, ele seguiu procurando, até tirar sua própria conclusão: “Foi aquele policial. Ele roubou minha câmera!”

“Que absurdo”, eu disse, já bravo com o irresponsável do meu companheiro de viagem. O dono do hotel se intrometeu e lhe contamos o que havia acontecido minutos antes. Depois de um suspiro, ele tirou os óculos, fez aquela cara de “já vi este filme antes” e nos disse: “Compañeros, lo siento, pero aquí no hay policía en la calle.”

“Caindo a ficha”

Ou seja, aquele homem não era policial coisa nenhuma, seu crachá era falso, a história das drogas e do registro era lorota, o telefonema tinha sido pro comparsa taxista, a câmera do Guilherme tinha sido roubada durante a revista na sua mochila e... “Opa, meu passaporte e meu dinheiro!”

Abri a bolsinha com o coração acelerado. O passaporte estava lá, mas os dólares não eram mais os mesmos. Apesar de eu não ter tirado os olhos deles por nenhum segundo enquanto o senhor os contava dentro do taxi, ele fez U$250 desaparecerem. “Pelo menos ele não levou tudo”, pensei alto, vendo a única nota de U$50 que tinha restado.

Andando de trem sem pagar


Viajar na Europa sem pagar é fácil; difícil é lidar com a própria consciência e com o medo de ser pego.

Cada cidade e meio de transporte tem características específicas que facilitam ou dificultam esse pequeno delito. Quanto menor for a preocupação com a ética, mais fácil fica, pois o risco de ser pego é, matematicamente, bem pequeno. Tudo bem, o risco é pequeno, mas o flagrante é inesquecível.

Aventura arriscada

Um exemplo disso aconteceu uma vez em que percorria um trajeto de 30 km com minha amiga hondurenha e também intercambista Karen. Não só gostávamos de economizar, mas também o fazíamos por necessidade. Por isso entramos no trem sem pagar os cerca de oito euros que, na época, custava a passagem.

Apesar de já estarmos acostumados com a tensão, aquele dia a adrenalina nos mostrou que havíamos abusado da sorte ao limite.

Antes do que esperávamos, o controlador chegou ao nosso vagão. Rapidinho, entramos juntos no banheiro e ficamos quietos. Claro que, logo em seguida, alguém bateu na porta, mas não queríamos abri-la de jeito nenhum.

“Ele vai embora”, torcíamos. Em vão. Minutos depois, o sujeito continuava batendo na porta. Claro que não era a primeira vez que lidava com espertalhões como nós.

Procurando uma saída

Bolamos uma estratégia. Resistiríamos mais alguns minutos, até que o trem parasse na nossa cidade. Assim que as portas da locomotiva se abrissem, o controlador de bilhetes precisaria sair dela por cerca de um minuto. Eu o veria pela janela do banheiro e, rapidamente, correríamos para a porta mais distante, já que estávamos entre duas portas de saída do trem.

Seguimos o plano à risca. Depois de frearmos, vi o vulto do controlador a poucos metros de mim, Karen e eu abrimos o banheiro e corremos para a outra porta, por onde saltamos com nossas mochilas em direção à liberdade.

Purgatório

Só não contávamos com um outro controlador que estava, já na plataforma, nos esperando. Me senti como se estivesse no purgatório. “É agora que vamos ao céu ou ao inferno”, pensei.
Primeiro, veio a bronca. Karen e eu fizemos de conta que não entendíamos nada – coisa manjadíssima - , mas não convencemos o sujeito. Ele insistia que pagássamos uma multa. “Ou vocês pagam ou chamo a polícia agora”, nos ameaçou.

Pronto. Era o que faltava para Karen cair no choro. Se lambuzando em lágrimas, a baixinha hondurenha implorava, numa mistura de espanhol e alemão, para que o homem perdoasse a estupidez de dois jovens intercambistas que nunca mais fariam aquilo.
ão era encenação.

Nem o coração gelado do alemão pode resistir aos prantos da menina. Até eu fiquei preocupado com minha melhor amiga da época vendo que o desespero dela n

Antes que ela desmaiasse ali na plataforma, o controlador nos liberou, apitou para o motorista, entrou no trem e partiu.

Pelo que me lembro, a Karen nunca mais andou de trem, metrô ou ônibus sem pagar. A Karen…

Seis dicas para economizar tempo em um breve tour

Em algum momento das suas andanças, você terá apenas algumas horas ou poucos dias para passar em um lugar cheio de atrações.

Apesar de não conseguir ver tudo que a cidade tem a oferecer, você pode pelo menos se preparar para aproveitar mais o tempo durante o passeio. Veja como isso é possível:

1 - Contatos

Procure estabelecer contatos com pessoas nativas antes de chegar à cidade. Ainda que vocês não se encontrem de fato, elas podem pelo menos dar dicas que você não encontrará jamais em guias turísticos. Isso sem contar nas portas que podem abrir, como apresentando um amigo que trabalha num restaurante tal, um DJ que vai tocar numa discoteca, uma prima que tem entradas para museus etc.

2 – Mapa

Se não tiver um guia turístico, serve um mapa impresso no computador ou de um centro turístico mesmo. Assim que chegar na cidade, tente conseguir um no próprio aeroporto ou na estação de trem.

Estude o mapa, marque os pontos de interesse prioritários e leia exaustivamente os nomes das ruas, ainda que sejam impronunciáveis. Quando estiver andando, será de grande valia reconhecer nomes familiares nas placas sem precisar ficar olhando de novo no mapa a cada 50 metros.

3 – Transporte

Compre um bilhete para o dia todo (ou um período maior, dependendo da duração da sua estadia). Avaliando quanto lhe custará voltar à cidade, não é aconselhável desperdiçar tempo economizando com transporte público.

Uma alternativa ainda melhor é alugar uma bicicleta ou usar seus patins. Neste caso, lembre-se de levar também um par de sapatos na mochila para entrar em lugares onde patins são proibidos.

4 – Previsão do tempo

Independentemente da estação do ano, o dia pode ser de sol ou de chuva. Por isso, confira na véspera a previsão do tempo. É fácil: basta “googlar” weather + nome da cidade. Em caso de chances de chuvas, carregar uma sombrinha é essencial para não ficar barrado embaixo de um toldo no meio do seu tour esperando a chuva passar.

5 – Peso

Leve apenas o necessário e distribua o peso com o seu ou a sua acompanhante. Cada um com uma mochila leve é melhor do que um carregando o peso para todos.

Outra dica: muitos museus têm cofres ou armários gratuitos para os visitantes. Aproveite para se livrar da mochila pelo menos durante a caminhada dentro desses lugares.

6 - Alimentação

Leve sempre uma garrafa pequena de água e alguns “lanchinhos”. Nada de chocolate ou algo que possa derreter. Sanduíches e barras de cereais são boas sugestões.

Evite almoços pesados. O melhor é tomar um café da manhã reforçado antes de começar o passeio, beliscar uma ou outra coisinha durante o dia e, à noite, jantar bem antes de relaxar.

Hospede ou durma na casa de alguém de graça

Quer viajar, mas não pode arcar com as despesas de hospedagem? Se você não é do tipo que precisa de luxo e privacidade nas noites que passa fora do seu confortável quarto, que tal ficar na casa de alguém sem pagar nada?

Graças a sites como Hospitality Club e Couch Surfing, é possível encontrar pessoas que, nos lugares mais remotos da Terra, estão dispostas a ceder o sofá da sala, um colchão no chão ou até mesmo um quarto de visita pra estranhos como você.

Dizer estranho é um pouco de exagero. Afinal de contas, esses sites funcionam mais ou menos como o Orkut e Facebook. São, portanto, também comunidades virtuais das quais qualquer pessoa pode fazer parte sem gastar nada.

Depois de se registrar no pioneiro Hospitality Club ou no mais conhecido Couch Surfing, o esquema é o mesmo que você provavelmente já conhece: preencher informações do seu perfil, adicionar fotos opcionais, contar um pouco sobre sua personalidade e seus interesses num texto curto, especificar quais idiomas você domina e por aí vai.

Diferenças

Esses sites têm algumas diferenças que vão desde o layout até a possibilidade de acumular “amigos”, mas eles apresentam um ponto importante em comum: todos os membros devem informar se também estão dispostos a hospedar outros na sua casa. Ninguém é obrigado a receber ninguém em seu lar. Apesar disso, é claro que não faz muito sentido se registrar nesses sites só pra se aproveitar da boa-vontade dos outros. Afinal de contas, é por essa troca de lugares no sofá que ambas as comunidades funcionam.

O fato de uma pessoa informar em seu perfil que pode hospedar alguém não significa, entretanto, que você pode automaticamente bater na porta dela com a mochila nas costas.

Impressão, torcida e sorte

Depois que você lhe escrever explicando quando deseja ficar na casa dela, é preciso torcer pra que ela vá com sua cara, confie em você, tenha disponibilidade naquele período... ou simplesmente que esteja com saco de hospedar alguém naqueles dias. Por isso não é de se espantar que, muitas vezes, as pessoas nem respondam ao seu primeiro recado.

Também não faz sentido entrar num site desses pra procurar namorado(-a). Ainda que existam várias histórias de casais que se conheceram por meio deles, o bacana é conhecer pessoas com mente aberta, interesses comuns e geralmente poliglotas de todo o mundo.

Parece bobagem, mas hospedar outras pessoas e ter a sensação de “pagar” por tudo que já fizeram quando você mesmo precisou de um cantinho também é muito bom.

Pra quê ficar lendo mais se você pode acessar o
Hospitality Club ou o Couch Surfing e tirar todas suas dúvidas? Boa sorte!

Os mortos de Varanasi

Em dois meses andando pela Índia, minha irmã e eu já tínhamos visto a caótica Mumbai, a capital Déli, o deserto do Rajastão, o imponente Monte Evereste, o maravilhoso Taj Mahal e muito mais. Aos poucos, já começávamos a achar que aquele país exótico não tinha mais muito a oferecer aos nossos olhos famintos.

Algo que ainda não havíamos visto, porém, nos aguardava naquela manhã, quando acordamos bem cedo e, ansiosos, deixamos o hotel no centro de Varanasi e fomos caminhando em direção ao Rio Ganges.

Não era a água que buscávamos, e sim a fumaça que parecia ganhar mais consistência conforme os raios do sol se tornavam mais fortes.

Enquanto seguíamos beirando o Ganges, desviávamos dos estrumes de vacas e búfalos e víamos como os indianos se banhavam, escovavam os dentes e lavavam suas roupas na mesma água escura do rio.

E isso não era tudo. A fumaça ia ficando mais forte e, aos poucos, podíamos sentir também seu cheiro. Carne. Sim, tinha cheiro de carne. Não de gado ou de porco, mas de gente.

Não era permitido fotografar, mas qualquer um podia ver o que eles faziam ali. E eu, curioso, me aproximei o máximo que pude e passei a assistir a tudo que acontecia.

Cadáver

Cantarolando, um grupo de pessoas se aproximou carregando um cadáver e o colocou sobre um punhado de madeiras. Era um homem com o corpo enrolado em um pano laranja e amarrado em uma maca de bambu. O rosto e os pés estavam descobertos.

Alguém acendeu a fogueira. Eu estava a uns 3 ou 4 metros de distância, com os olhos atentos, provavelmente refletindo as luzes do fogo. Em segundos, o cadáver ficou sem cabelos e sem o tecido que o envolvia. Os olhos perderam a cor branca e a forma redonda, a pele começou a derreter e, em meio às chamas e aos estalos típicos de uma fogueira, eu tinha relances dos músculos, órgãos e ossos sendo fritos e assados.

Pouco tempo depois, só havia restado cinzas e carvão misturado com ossos. Olhando ao meu redor, tive a impressão de ser o único que se espantava com aquelas cenas todas. Afinal de contas, aquela gente estava acostumada ao ritual que, todas as manhãs, se repete dezenas ou centenas de vezes como parte da crença hindu de várias vidas.

O que aconteceu em seguida foi muito rápido: as cinzas foram jogadas no rio, novos pedaços de madeira formaram uma outra fogueira e, em poucos minutos, lá estava mais um cadáver prestes a ser cremado ao ar livre.

Pra indianos pobres e miseráveis, a madeira pode custar uma fortuna. Por isso, muitos deles enrolam os parentes mortos em pedras e simplesmente os jogam no Ganges. É por isso que ver corpos ou partes deles boiando no rio ou encalhados nas margens é algo comum em Varanasi.

O que é fundamental pra aprender um idioma

Se está prestes a ir viver fora do Brasil, você deve estar ciente de que dominar o idioma daquela região será crucial pra sua integração à cultura local. Além disso, conseguir se comunicar bem com os nativos não só evitará muitas más experiências, como também tornará as boas ainda melhores.

Nem todo mundo que começa a aprender outra língua, entretanto, faz isso por causa de uma viajem ao exterior. Há também quem busque esse conhecimento por causa do trabalho, pra entender letras de músicas ou textos científicos, por imposição dos pais, por mera curiosidade ou até mesmo pra poder paquerar alguém de outro canto do mundo.

As razões são, portanto, variadas, da mesma forma que as opções que temos hoje em dia pra conseguirmos esse conhecimento. Cursos no colégio e em escolas especializadas, aulas particulares, materiais audio-visuais pra auto-didatas, treinos com músicas e filmes, leitura e escrita com dicionários em mãos... Você pode escolher uma ou até todas essas opções.

O segredo é...

Qual é o segredo, então, pra tornar seu aprendizado realmente eficaz? Motivação. É claro que o método e a capacitação de quem lhe ensina também são relevantes, mas é mais importante pensarmos como o ditado que diz: “Não existem bons ventos para quem não sabe aonde quer chegar.”

Descubra o que você quer almejar estudando uma língua estrangeira. Pense no que pode ganhar com isso: nas vantagens em relação a outros concorrentes na sua área de estudos e trabalho, na facilidade pra se locomover virtualmente e fisicamente pelo mundo, no bem que pensar em outro idioma pode fazer ao seu cérebro e nas portas que se abrirão no futuro imprevisto.

Por mais que tenha tempo e ótimos professores e materiais didáticos, sem acreditar numa boa razão e visualizar os benefícios que você poderá atingir se tornando um bilíngue, trilíngue ou poliglota, provavelmente você estará perdendo tempo e dinheiro.

Mas que fique bem claro: só a motivação não ensina nada a ninguém. Por isso, quando estiver ciente do que tem a ganhar dominando outro idioma, junte a motivação à concentração, detalhismo e persistência… e mãos à obra!

Presos no aeroporto em Frankfurt

Depois de duas semanas passeando pela Dinamarca e Inglaterra, minha irmã e eu voltamos à Alemanha pra continuarmos nossas aventuras de quase um ano como mochileiros na Europa.

Assim que desembarcamos no enorme aeroporto de Frankfurt, seguimos em direção à saída e nos posicionamos naquela santa fila em cujo final alguém poderá mudar o curso de toda a sua vida com um simples carimbo.

A maioria dos passageiros passa sossegada. Alguns sofrem mais um pouco, suam, tremem, tiram uma porrada de papelada da bolsa e mostram até o dinheiro que estão levando pra convencer os oficiais da imigração a deixá-los passar. Outros, porém, por mais que se desesperem, se humilhem, chorem, esperneiem e contem que são irmãos do presidente ou filhos do Papai Noel, não conseguem seguir adiante.

Viajar com o passaporte brasileiro nunca foi, digamos, relaxante. Até esse dia, no entanto, eu nunca tinha sido barrado por um daqueles oficiais. Nessa tarde, porém, o que ouvi ao chegar na Alemanha não foi um „Willkommen“, mas sim um “Kommen Sie bitte mit”, que quer dizer: Me acompanhe, por favor.

Acompanhei um sujeito e minha irmã, que estava na fila ao lado, acompanhou o outro. Como é típico de histórias como estas, neste relato também tem a tal da ‘salinha’. É pra lá que fomos levados.

Presos

Nos sentamos e ficamos esperando em frente à porta. Não lembro se ela estava aberta ou fechada, mas me recordo de que não éramos os únicos à espera. Havia também uns 5 colombianos na mesma condição, com os destinos nas mãos de alguns alemães – o que, obviamente, não era muito animador.

Estávamos presos. Não estávamos algemados nem trancados em uma cela, mas nossos passaportes tinham sido sequestrados e nenhum de nós era louco ou desesperado ao ponto de tentar escapar numa hora daquelas.

O tempo passava e nada de ninguém vir falar com a gente. Estavam esperando um tradutor de português-alemão ser encontrado. Por sorte, resolveram descobrir que, depois de ter sido intercambista por um ano no país deles, eu também falava alemão. Assim pudemos começar o interrogatório sem mais demoras.

Se você nunca passou por uma situação assim, meus parabéns. Muitas vezes, a conversa na salinha termina em planos de volta pra casa no primeiro ou segundo voo, mas nós dois tivemos mais sorte dessa vez.

Explicações

Contamos que éramos estudantes universitários e que, depois dos intercâmbios na Dinamarca e na Alemanha, tínhamos decidido trancar o curso por um ano e ir descobrir mais do mundo começando na Europa.

Tivemos que contar tudo o que havíamos feito desde nossa chegada em Portugal quase 3 meses antes e convencê-los de que nosso plano era mesmo seguir viajando entre um país e outro ao invés de nos fixarmos em algum deles de forma ilegal.

Acabamos mostrando tudo que tínhamos em mãos: nossas carteirinhas de estudantes , as passagens de ida pra Índia dali a 4 meses e a de volta ao Brasil dali a 8 meses, carta da minha antiga família hospedeira e até nossos diários, nos quais relatávamos nossas andanças e, por sorte, colávamos vários dos bilhetes das passagens.

Ainda por cima, dei o endereço da minha namorada alemã e contei que tinha uma conta num banco que eu só podia movimentar pessoalmente na época - sem cartão ou internet, como hoje.

Livres

Depois de umas duas horas, os oficiais tiveram a mesma reação que você provavelmente está tendo agora: “Ai, tá bom, chega!”, eles devem ter pensado. Foram até gentis e bem didádicos com as explicações sobre o Acordo do Schengen, explicando-nos que podíamos passar só 90 dias em todos os países que faziam parte daquele acordo. Contando a dedo, nossos passaportes indicavam que já tínhamos usado 68 desses dias. Por isso estávamos ali.

Escapamos, mas seguimos à risca as instruções pra conseguirmos uma prorrogação do nosso visto. E deu certo. Será que os colombianos que ficaram lá também tiveram essa sorte?


A melhor história de caronas


Esta história começou numa manhã quente de junho de 2000, quando minha irmã e eu fomos até a saída de Milão, na Itália, com mochilas nas costas e bandeira do Brasil na mão, desafiando nosso destino. Depois de dois dias procurando em vão um trabalho em restaurantes e hotéis da cidade italiana, tínhamos decidido, naquele dia, tentar a sorte na Suíça.

Com 20 e 19 anos, respectivamente, não tínhamos muitos planos. Na verdade, nem sabíamos direito como a Suíça era e nunca tínhamos ouvido antes o nome da região pra onde decidimos ir aquele dia – do qual, aliás, nem nos lembramos mais hoje.

Tínhamos em mãos passagens pra Índia e alguns euros pra sobrevivermos lá, mas ainda faltavam três meses pra viagem. Precísavamos dar um jeito de encontrar um lugar pra morar e comer enquanto o dia do voo não chegava.

Nossa intenção era conhecer algum fazendeiro que nos oferecesse, por três meses, cama, comida e alguns francos suíços em troca do duro trabalho de alguma plantação de maçãs, uvas ou o que fosse. Detalhe: nossos vistos eram de turismo, o que dobrava a chance de não dar certo.

Bendito furgão azul

Depois de duas ou três caronas por curtos trajetos, nos encontrávamos já à tarde no norte da Itália, bem próximos da fronteira com a Suíça. Mental e verbalmente, deixávamos o otimismo combater o cansaço, a fome e a dúvida de que aquela loucura daria certo.

De repente, um furgão parou próximo à minha irmã e uma loira de cabelos curtos começou a falar com ela pela janela do banco de passageiros dianteiro. Dentro do automóvel estavam a Ketty, professora de dança, o marido Serge, artista plástico, e os filhos Aaaron (3), Shanna (6) e Mahran (11), além da cadela Rotweiller Lia.

Nos juntamos à família e seguimos viagem. Após algumas horas, o sol já estava indo embora e Ketty nos disse: “Já está ficando tarde. Vocês podem vir conosco e dormir na nossa casa. Amanhã ajudo vocês a procurar um trabalho na redondeza”. Claro que topamos.

Paraíso nos Alpes

Quando chegamos a Le Levron já era noite. Só na manhã seguinte, uma surpresa: olhamos pela sacada ao lado da cozinha e demos conta de que estávamos num pequeno vilarejo nos Alpes. Uma cena de filme.

Nesse dia, Serge partiu com as crianças em direção à França, onde passaria duas semanas na casa dos pais dele. Enquanto as malas eram feitas, Ketty telefonava pra conhecidos da região em busca de um trabalho para nós.

No sábado, ela propôs: “Tenho um curso de uma semana na Bélgica e preciso deixar a cadela com alguém. Se quiserem, vocês podem ficar aqui tomando conta dela e da casa. Talvez alguma das pessoas pra quem liguei volte a telefonar e vocês consigam algum trabalho.”

Deu certo. Quando Ketty voltou de viagem, já estávamos, de fato, trabalhando como garçons numa estação de esqui vizinha. Depois, conseguimos uns “bicos” como zeladores com umas vizinhas queridíssimas que falavam português.

Laços

No final das contas, acabamos passando três meses naquele pequeno paraíso. Minha irmã viveu o tempo todo com Ketty e ganhou uma grana cuidando das crianças dela. Eu passei a maior parte do tempo na casa do Nicolas, o vizinho que já tinha vivido no Brasil, e dei uma ajeitada no jardim da Ketty.

Conhecemos o vilarejo inteiro, fizemos algumas amizades e nos apegamos à família de tal forma que, assim que voltamos da Índia, retornamos ao vilarejo pra passarmos o Natal e Ano Novo na companhia da nossa amiga Ketty, do marido e dos nossos “irmãozinhos”.

Planejamento x informação

O que geralmente fazemos assim que decidimos viajar pra algum lugar? Corremos atrás de pacotes turísticos, passeios, reservas de hotéis e de passagens de trem, ônibus etc., não é mesmo?

Na nossa cabeça, estamos não só lidando com a ansiedade, mas também solidificando a fortaleza que construímos ao nosso redor com precauções. Afinal de contas, achamos que quanto melhor for o planejamento, menos imprevistos deverão aparecer durante o passeio.

Acontece que a segurança nem sempre é garantia de uma viagem divertida e imprevistos nem sempre são malignos. Pelo contrário. Muitas aventuras têm início quando baixamos a guarda, corremos riscos e nos deixamos levar por um fator-surpresa.

Aventuras

Se você está buscando justamente uma aventura, a dica é se informar o máximo que puder antes de embarcar pro país-destino.

Não precisa comprar passagens de um lugar ao outro lá, por exemplo, mas saiba onde encontrá-las se precisar delas. Também não se desespere reservando quartos em hotéis ou albergues antes de ter a certeza de que, depois de ter chegado àquele país, ainda vai querer ir naqueles determinados dias àqueles determinados lugares.

Em vez disso, leia guias turísticos e fóruns na internet. Procure documentários de vídeo sobre as regiões que lhe interessam e tente entrar em contato com pessoas que já estiveram por lá. Guarde esses contatos.

Com informação, você verá que o medo do desconhecido terá sido amenizado e poderá viajar com a cabeça mais livre... pronta “pro que der e vier”.