Cidadania italiana

A Itália tem pouco mais de 60 milhões de habitantes. No entanto, provavelmente cerca de 60 milhões de cidadãos brasileiros, argentinos e estadunidentes também têm “sangue italiano”. A Embaixada Italiana em Brasília estima que o Brasil tem 25 milhões descendentes dos imigrantes que chegaram ao país principalmente a partir da década de 1870.

Como você já deve saber, vários desses descendentes têm se esforçado para conseguir a dupla cidadania e conquistar, com isso, o direito de ir à Europa quando bem entenderem e permanecer quanto tempo quiserem.

Como é fácil de compreender, a procura é desproporcional ao contingente dos consulados e ao interesse dos italianos em concederem a dupla cidadania. Assim, milhares de pedidos tanto de brasileiros quanto de argentinos de reconhecimento da cidadania italiana estão emperrados há anos nos consulados desses países sul-americanos. Por isso, os descendentes mais dispostos vão pessoalmente até a terra natal dos antepassados em vez de esperar sentados.

Foi o que fiz em 2005. Cheguei em Roma como brasileiro e, sete meses depois, saí de lá como italiano. Dois anos mais tarde, foi a vez da minha mãe repetir a história, já que o reconhecimento da minha cidadania não implicava no reconhecimento da dela. Apesar do tempo passado, acredito que pouca coisa tenha mudado nos procedimentos básicos. Espero que estas dicas possam ajudar:

Ainda no Brasil

Só pense em ir para a Itália quando tiver:

- todos os documentos originais necessário, conforme os sites dos consulados especificam;

- a tradução deles feita por um tradutor juramentado*;

- a autenticação dos documentos com suas respectivas traduções, feita pelo consulado italiano que atende a região em que você mora**.

* O site do “seu” consulado deve ter uma lista com os tradutores juramentados do seu estado.
** Uma taxa é cobrada e também deve haver uma fila de espera para isso, mas nada melhor do que ir pessoalmente cedinho ao consulado para tentar conseguir os tais carimbos.

Na Itália

Se não tiver um visto de estudante ou de trabalho, você pode entrar na União Europeia como turista. Turistas recebem automaticamente um visto de três meses e não podem trabalhar. Mostrar todos os documentos e contar o porquê da sua viagem à Itália não irá alterar o tipo ou o prazo do seu visto.

A cidade em que você irá residir deve ser a mesma em que você “dará entrada no processo” de reconhecimento da cidadania. Porém, não precisa ser a cidade em que seu parente italiano nasceu.

Assim que chegar à cidade que tiver escolhido, a primeira coisa a fazer é se registrar na polícia logo na primeira semana. Não espere cordialidade, esteja bem atento aos horários de abertura de tudo que é público e acostume-se desde essa etapa a seguir as instruções burocráticas nos mínimos detalhes. Uma manhã inteira de viagem até a polícia e na fila de espera com estrangeiros das mais variadas partes do mundo podem ser em vão se um formulário ou uma foto estiverem faltando.

Com o tal registro em mãos, o próximo passo é procurar um lugar onde você possa morar oficialmente. Isso significa que você deverá se inscrever como residente naquele endereço. A inscrição é feita na anagrafe della popolazione residente (APR), uma extensão da prefeitura encarregada dos registros de nascimento, matrimônio, divórcio, adoção, óbito e naturalização. Cidades grandes têm várias anagrafi. Procure a do seu bairro.

Aqui, prepare-se para enfrentar dois impecilhos:

- alguns funcionários públicos podem hesitar em lhe dar esse registro porque “você é um turista”;

- a própria pessoa que lhe aluga o imóvel ou cômodo pode se negar a registrar você na casa.

Se tudo correr bem, você se registra e espera até que algum oficial lhe faça uma visita surpresa naquele endereço. Não tem nada de mais. É abrir a porta, deixa-lo(s) entrar, ver que você mora mesmo ali, assinar um documento ali e pronto. Alguns dias depois, constará na anagrafe que você é, oficialmente, residente na Itália.

Algumas pessoas procuram entidades da Igreja ou organizações não governamentais e conseguem esse registro de residência muito mais fácil e rapidamente. Se você optar por essa busca, é mais provável que tenha êxito numa cidade grande.

Com o registro na polícia, a comprovação da residência e todos seus documentos originais, traduzidos e autenticados, você deve se dirigir ao Comune (prefeitura) para, finalmente, solicitar sua naturalização. Por via das dúvidas, é bom levar também cópias dos documentos conseguidos nos dias anteriores e algumas fotos extras. Em casa, não custa guardar cópias de todos os papeis que você levou do Brasil.

Na prefeitura, algum funcionário analisa todos os documentos e lhe diz se está faltando algo. Torça para que não esteja. Depois disso, você recebe um comprovante de que “deu entrada no processo” e “aguarda até que alguém lhe contate” quando tudo estiver pronto. Como “quem espera, nem sempre alcança”, sugiro que você anote os telefones e nomes de quem lhe atendeu e, a partir de um ou dois meses depois desse dia, comece a ligar a cada semana ou quinzena cobrando um parecer.

Essa é a parte mais demorada do processo. Segundo os funcionários da prefeitura, esta cobra do consulado que autenticou sua papelada no Brasil uma confirmação da veracidade da sua identidade e de todos os documentos. Pode levar dois meses, três, quatro... ou um ano. Por isso pode ajudar ficar cobrando. Depois que receber a confirmação do consulado, a prefeitura deixa sua naturalização pronta em minutos.

Com a naturalização em mãos, é hora de correr atrás dos seus documentos de identidade italianos. O primeiro deles é a certidão de nascimento, que lhe é feita instantaneamente na sua velha conhecida anagrafe. É apenas uma nova certidão em italiano, com os mesmos dados da sua brasileira.

Em seguida, requeira ali mesmo a carteira de identidade. É necessário que duas testemunhas estejam presentes para confirmar que você é você. Por isso, leve amigos ou peça para alguém ali mesmo para lhe fazer esse favor.

Por último, você pode ir à polícia para solicitar seu passaporte italiano, o qual deve ficar pronto em até três semanas. Por favor, não me culpe se demorar mais.

Para a identidade e o passaporte, também existem várias instruções – fotos assim e assado e cópias disso e daquilo - , mas nada que não se possa resolver em meio dia de correria.

Se quiser permanecer na Itália, você ainda precisará de um código fiscal, uma conta bancária e por aí vai. Mas isso você já pode descobrir lá, não é mesmo?

Com organização, otimismo e um bocado de sorte, 4-6 meses na Itália podem ser o suficiente para se tornar um cidadão da União Europeia e ficar livre para escolher onde viver na Itália ou em qualquer outro país europeu. Buona fortuna!

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